25/01/2022

Roteiro Ecuménico de Oração 2022



Apresentação
Roteiro em pdf

Semana de Oração pela Unidade dos Cristão - 25 de janeiro de 2022

DIA 8

«Retiraram-se para a sua pátria por outro caminho» (Mt 2,12)
Dos habituais caminhos de separação
aos novos caminhos de Deus

Leituras
Jr 31,31-34 Firmarei com a comunidade de Israel uma nova aliança.
Sl 16 Tu me fazes conhecer o caminho da vida.
Ef 4, 20-23 Precisais ser renovados pela transformação espiritual de vossa inteligência.
Mt 11, 25-30 Eu te louvo por teres ocultado isso aos sábios e aos inteligentes e por o terdes revelado aos pequeninos

Reflexão
Não sabemos o que os sábios pensaram – eles que eram especializados em astronomia e navegação – quando foram advertidos para regressarem por outro caminho. Eles bem podem ter ficado muito confusos, mas a mesma luz que tinha iluminado a sua jornada mostrou-lhes que havia outro caminho, outra possibilidade. Foram chamados a mudar de direção. Frequentemente vemo-nos ligados às nossas maneiras habituais de fazer as coisas ou de ver o mundo. Quando essas maneiras ou “caminhos” se fecham, ficamos a imaginar como vamos agir e prosseguir a nossa jornada. A providência divina está sempre lá para nos mostrar que há um outro caminho preparado para nós. Deus está lá para renovar a sua aliança e nos erguer da frustração que experimentamos quando nos deparamos com um obstáculo. Apenas temos de confiar que o eterno Senhor que nos deu a luz pode sempre achar um caminho que nos leve adiante quando os nossos modos de agir e os nossos caminhos estão bloqueados. É sempre possível um novo começo quando estamos desejosos e abertos ao trabalho do Espírito. Como Igrejas olhamos para o passado e encontramos iluminação, e olhamos para o futuro em busca de novos caminhos para que possamos continuar a viver o brilho da luz do Evangelho com renovado fervor e nos acolhermos uns aos outros como Cristo nos acolheu para glória de Deus. Nos caminhos antigos e habituais as comunidades cristãs têm caminhado separadas umas das outras. Nos novos caminhos para os quais Deus nos chama, os cristãos caminham juntos e tornam-se companheiros de peregrinação. Encontrar esses novos caminhos exige discernimento, humildade e coragem. Agora é o tempo da conversão e da reconciliação.

Oração
Deus cheio de graça, quando conhecemos apenas um caminho e achamos que é por ele que devemos retornar, e quando pensamos que todas os caminhos estão bloqueados e caímos no desespero, lá sempre te encontramos. És o Deus das renovadas promessas. Nós te encontramos a criar um novo caminho diante de nós, algo que não esperávamos. Nós te agradecemos porque ultrapassas as nossas expectativas. Nós te agradecemos pela tua sabedoria que vai além da nossa compreensão. Nós te agradecemos porque os teus caminhos criativos nos abrem possibilidades não previstas. Podemos olhar os mapas da nossa vida e não encontrar uma boa rota, mas sempre te encontramos e levas-nos a um caminho ainda mais excelente. Oramos com Jesus Cristo nosso Senhor, na companhia do Espírito Santo, para que sempre sejamos levados de volta até ti. Amém.

24/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristão - 24 de janeiro de 2022

DIA 7

«Abrindo os seus tesouros, ofereceram-lhe como presente
ouro, incenso e mirra» (Mt 2,11)
Os dons de comunhão

Leituras
Os 6,1-6 Pois é o amor que me agrada, não o sacrifício.
Sl 100 Entrai pelas suas portas rendendo graças, em seus átrios louvando-o
At 3,1-10 Ouro ou prata eu não tenho; mas o que tenho, isso te dou
Mt 6,19-21 Onde estiver o teu tesouro, ali também estará o teu coração

Reflexão
Na nossa jornada para Belém, a cidade do pão, contemplamos os sábios que vieram adorar o Menino Jesus. Abriram os seus tesouros e ofereceram ao rei recém-nascido os seus presentes: ouro, incenso e mirra. As nossas divisões históricas, a nossa determinação errada em relação a regras e rituais, e a nossa preocupação com assuntos mundanos levaram-nos à separação. Então, que presentes temos preparado para oferecer ao rei que veio para iluminar as nossas vidas e nos conduzir à graça da unidade? Sabemos que Deus não quer as nossas riquezas ou ofertas de sacrifícios no fogo, mas que o seu poder aja através da nossa pobreza: «ouro ou prata não tenho». O Senhor deseja que os nossos corações estejam a pulsar e amar: sejam os corações cheios de amor por ele e pelos nossos irmãos e irmãs em Cristo, dos quais estamos separados, corações a transbordar com atos de misericórdia e corações realmente penitentes e com desejo de mudança. Então preparemos para ele o presente de um coração cheio de amor. Ajoelhar-se em adoração é algo que requer corações que estejam em contrição por causa do pecado que nos divide e que sejamos obedientes ao Senhor a quem servimos. Essa obediência reaviva, cura e reconcilia tudo o que está quebrado ou ferido em nós, ao nosso redor e entre nós como cristãos. Cristo já deu o dom de unidade à sua Igreja. Crescemos em comunhão à medida que partilhamos as graças que as nossas diferentes tradições têm recebido, reconhecendo que a fonte dos nossos dons é o Senhor.

Oração
Todo louvor, glória e ação de graças a ti, ó Deus. Foste revelado na epifania de teu Filho, tanto para os que esperaram muito tempo pela tua vinda como para os que não tinham essa expectativa. Conheces o sofrimento que nos cerca, a dor causada pelas nossas divisões. Vês o mundo em luta e a triste situação de hoje no Médio Oriente – o lugar em que escolheste nascer, que foi santificado pela tua presença. Nós te pedimos que capacites os nossos corações e as nossas mentes para te conhecermos. Ao unirmo-nos aos sábios vindos de longe, oramos para que abras os nossos corações ao teu amor e ao amor aos irmãos e irmãs ao nosso redor. Dá-nos disposição e meios para trabalharmos pela transformação deste mundo e para oferecermos uns aos outros dons que podem alimentar a nossa comunhão. Concede-nos os teus dons e bênçãos permanentes. Recebe a nossa oração em nome de teu Filho Jesus Cristo, que vive e reina contigo e com o Espírito Santo. Amém.

23/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristão - 23 de janeiro de 2022

DIA 6

«Viram o menino com Maria, sua mãe,
e prostrando-se, adoraram-no» (Mateus 2,11)
Unidos em adoração ao redor do único Senhor

Leituras
Ex 3,1-6 Moisés cobriu o rosto, pois tinha medo de ver a Deus.
Sl 84 Como são amadas as tuas moradas, Senhor de todo poder!
Ap 4, 8-11 Adoravam o que vive pelos séculos dos séculos.
Mt 28, 16-20 Quando o avistaram, prostraram-se.

Reflexão
Quando os magos vindos dos seus países distantes chegaram a Belém viram o Menino com Maria, sua mãe, e prostrando-se adoraram-no. Na presença dessa revelação de Deus entre nós, os olhos dirigem-se para baixo e os joelhos dobram-se. Do mesmo modo, ao ver a sarça ardente, Moisés escondeu a sua face com receio de olhar para Deus. Quando os discípulos viram Cristo ressuscitado na montanha na Galileia, ficaram surpresos e perturbados. Ainda assim, adoraram-no. Na liturgia celeste, os vinte e quatro anciãos prostraram-se diante d'Aquele que está sentado no trono. Diante da presença de Deus, respondemos assim: fazendo uma contemplação, seguida de deslumbramento, que leva à adoração. Vemos? Estamos maravilhados? Estamos de facto a adorar? Quantas vezes olhamos e não percebemos, com os nossos olhos ainda cegos diante da presença de Deus? Como podemos adorar verdadeiramente se primeiro não vemos? Na nossa visão estreita, muito frequentemente enxergamos apenas as nossas confusas discordâncias, esquecendo que o Senhor deu a todos nós a sua graça salvadora e que partilhamos o mesmo e único Espírito que nos conduz à unidade. Frequentemente no nosso orgulho seguimos as nossas próprias leis e tradições humanas, enquanto muitas vezes estamos a desconsiderar o amor que somos chamados a partilhar como povo justificado pelo sangue de Cristo, com uma fé comum em Jesus como nosso Salvador. Como comunidades vivificadas pelo Espírito Santo, as nossas igrejas chamam-nos a caminhar juntos na direção do Menino Jesus para lhe oferecer, como povo unido, a nossa homenagem. O Espírito de compaixão orienta-nos uns para os outros e, estando juntos, guia-nos a todos para o nosso único Senhor. Somente seguindo essa orientação seremos capazes de «adorar em espírito e verdade». O nosso futuro em Deus é um futuro de unidade e amor; a nossa caminhada nessa direção precisa de ser um reflexo da mesma verdade da unidade em Cristo.

Oração
Deus Compassivo, que deste aos cegos a visão interior para te reconhecerem como seu Salvador, torna-nos capazes de nos arrependermos. Na tua misericórdia, remove as escamas dos nossos olhos e leva-nos a adorar-te como nosso Deus e Redentor. No meio da nossa tristeza e apesar da profundidade dos nossos pecados, dá-nos a capacidade de te amar com todo o nosso coração. Queremos caminhar juntos guiados pela tua luz, com um só coração e uma só alma, como fizeram os primeiros discípulos. Pedimos que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo esteja sobre nós, para que juntos te glorifiquemos, vivendo na companhia do Espírito Santo e sendo de tudo isso testemunhas para todos ao nosso redor. Amém.

22/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos - 22 de janeiro de 2022

DIA 5

«O astro que tinham visto no oriente
avançava à sua frente» (Mt 2,9)
Guiados por um único Senhor

Leituras
Ex 13,17-14,4 O próprio Senhor ia à frente deles como coluna de nuvem.
Sl 121 Levanto os olhos para as montanhas: donde me virá o socorro?
Ap 22, 5-9 O Senhor Deus difundirá sobre eles a sua luz.
Mt 2, 7-10 O astro que tinham visto no oriente avançava à frente deles.

Reflexão
As Escrituras dizem-nos repetidamente como o Senhor caminha com os que são do seu povo, protegendo-os e zelando por eles dia e noite. O caminho pode não ser sempre para a frente: às vezes somos levados a reorganizar os nossos passos e, outras vezes, a retornar por uma rota diferente. Mas em toda a nossa caminhada pela vida podemos estar confiantes que Deus, que nunca dorme ou descansa, nos protege quando tememos que os nossos pés escorreguem e possamos cair. Mesmo na maior escuridão, a luz de Deus está connosco. A sua luz brilha através dos profetas enviados para guiar o povo de Deus no caminho colocado diante deles e para recordar a aliança. De modo mais perfeito, quando o tempo se completa, Deus envia seu Filho unigénito, Jesus Cristo. Ele é a luz orientadora de todas as nações, a glória de Deus no mundo, a fonte de vida divina, que sela com o seu sangue uma nova aliança. O caminho à nossa frente que nos levaria à unidade de uns com os outros, e assim a uma união mais próxima com Cristo, nem sempre é claro. Nas nossas mais sérias tentativas de nós próprios construirmos a unidade é muito fácil perder de vista esta mensagem fundamental das Escrituras: Deus não abandona o seu povo mesmo no meio das falhas e divisões que ali existem. Isso não é só uma mensagem de esperança para os cristãos, mas é-o para o mundo inteiro. Como a história dos magos nos faz lembrar, Deus guia toda espécie de povo, com a luz da estrela, para onde Cristo, a luz do mundo, há de ser encontrado. Deus envia o Espírito Santo cuja luz nos capacita para vermos com os olhos da fé a verdade do Filho divino e o chamamento para promover nele a unidade e a reconciliação de todas as coisas. É esse Espírito que nos conduz da escuridão e da tragédia para a luz e a vida de Cristo.

Oração
Senhor Deus, nosso Pai, enviaste a estrela para conduzir os magos ao teu Filho unigénito. Aumenta a nossa esperança em ti e leva-nos a perceber todo o tempo em que caminhas connosco, zelando pelo teu povo. Ensina-nos a seguir a orientação do Espírito Santo, por estranho que possa parecer o caminho, para que possamos ser conduzidos à nossa unidade em Jesus Cristo, a luz do mundo. Abre os nossos olhos ao teu Espírito e dá-nos coragem na nossa fé, para que possamos confessar que Jesus é Senhor, adorando-o e alegrando-nos nele como fizeram os magos em Belém. Nós te pedimos essas bênçãos em nome do teu Filho Jesus Cristo. Amém.

21/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos - 21 de janeiro de 2022

DIA 4

«E tu, Belém, não és decerto
a menos importante das sedes de Judá» (Mt 2,6)
Mesmo sendo pequenos e sofredores, nada nos falta

Leituras
Mq 5, 1-5,7-8 De ti sairá para mim aquele que deve governar Israel.
Sl 23 O Senhor é meu pastor, nada me falta.
1 Pd 2, 21-25 Agora voltastes-vos para o pastor e guarda das vossas almas.
Lc 12, 32-40 Não temas, pequeno rebanho.

Reflexão
A partir da pequena e simples cidade de Belém, o Senhor, Filho Deus, fez sua entrada no mundo. Do útero de uma humilde jovem dessa cidade, Ele assumiu carne humana e escolheu viver a sua humanidade com simplicidade. Ele tornou-se semente no campo, fermento na massa e um pequeno raio de luz para os nossos olhos, e essa luz encheu a terra. Da obscuridade de Éfrata veio um governante, o pastor e guardião das nossas almas. E embora ele seja o nosso Pastor, tornou-se o Cordeiro que carregou os pecados do mundo para que fôssemos curados. Embora seja pouco significativa entre as cidades de Judá, Belém tornou-se grande por causa do nascimento do Pastor de todos os pastores, do Rei de todos os reis. Belém, um nome que significa «casa do pão», pode ser uma metáfora para a Igreja que traz ao mundo o pão da vida. A Igreja, a Belém de hoje, continua a ser o lugar onde os fracos, os sem poder e os pequenos são bem-vindos, porque nela cada um tem lugar. O conjunto dessas sementes torna-se a colheita. As sementes unidas tornam-se uma força poderosa. Os raios tornam-se uma luz orientadora. No meio de distúrbios políticos, de uma crescente cultura de ambição e do abuso de poder neste mundo, tanto os cristãos como outros no Médio Oriente sofrem perseguição e experimentam um sentimento de marginalização, vivendo com receio de violência e injustiça. Ainda assim, eles não estão assustados porque o Pastor caminha com eles, reunindo-os num campo e fazendo deles um sinal da sua presença amorosa. Unidos, eles são o fermento que faz crescer a massa. Em Cristo, eles encontram um modelo de humildade e dele ouvem um chamamento para superarem as divisões e estarem unidos num só rebanho. Embora sejam poucos, no seu sofrimento seguem os passos do Cordeiro que sofreu pela salvação do mundo. Mesmo sendo poucos, estão seguros na esperança, nada lhes falta.

Oração
Bom Pastor, a fragmentação do pequeno rebanho entristece o teu Santo Espírito. Perdoa os nossos fracos esforços e o nosso vagaroso envolvimento no cumprimento de tua vontade. Dá-nos pastores sábios que, com um coração como o teu, reconheçam o pecado da divisão e conduzam as igrejas com correção e santidade para a união em ti. Nós te pedimos, Senhor: ouve a nossa prece. Amém.

20/01/2022

Teologia e justiça

A reverenda Anne Burghardt, da Igreja Evangélica Luterana da Estónia, é a primeira mulher e a primeira pessoa da região do centro e leste da Europa, a ser eleita Secretária-Geral da Federação Luterana Mundial. Teóloga e pastora, iniciou o seu mandato em novembro de 2021, substituindo o reverendo Martin Junge, que tinha estado à frente da comunhão mundial de 148 Igrejas luteranas desde 2010. Burghardt, de 46 anos, esposa e mãe de dois filhos biológicos e de um refugiado palestiniano adotado, reflete sobre o seu percurso até à liderança e os dons particulares que espera introduzir no seu trabalho.
 Publicado texto no mensário Donne Chiesa Mondo (janeiro de 2022) do jornal L'Osservatore Romano, traduzimo-lo e divulgámo-lo em português no contexto da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, como forma de conhecimento de outras Igrejas cristãs.


***


O meu país, a Estónia, é conhecido como uma das nações mais secularizadas do mundo. Assim, um dos dons com que certamente contarei é a experiência de partilhar a palavra de Deus com as pessoas numa sociedade secularizada. Nasci em 1975, durante a ocupação soviética, e cresci num ambiente familiar secularizado. Os meus avós tinham foram membros ativos da Igreja Luterana; em 1949, a minha avó foi deportada para a Sibéria juntamente com o meu pai e a minha tia. Como muitos outros que passaram por esse tipo de experiência, os meus avós hesitaram em envolver ativamente os filhos na vida da Igreja, por estarem preocupados com as consequências que isso poderia ter num Estado agressivamente ateu.

Convites e percursos


Foi um convite para a confirmação de um amigo do secundário que me colocou no caminho da ordenação - um caminho em que eu teria tido dificuldade de acreditar se alguém mo tivesse referido há 30 anos! A minha escola era uma das poucas que na época oferecia cursos de educação religiosa, e as discussões com os meus colegas de turma acenderam dentro de mim uma centelha. Todos estavam à procura de uma identidade, tanto a nível nacional como pessoal, e eu interessei-me cada vez mais por questões religiosas.
Olhando em retrospetiva para o meu percurso de fé, diria que alguns vivem um caminho de crescimento natural no seio de uma família cristã tradicional. Há quem se converta de repente, como o apóstolo Paulo. Há ainda outro caminho, que é o meu, de crescimento lento mediado por muitas questões, passo a passo, cada vez mais enraizado na fé. Em 2004, dez anos após aquele convite que recebi do meu amigo da escola secundária, dei por mim a ser ordenada pastora na Catedral de Santa Maria em Tallinn, porque senti que queria servir a Igreja com os dons que me tinham sido dados.

Ecumenismo e formação


Entretanto tinha estudado teologia na antiga Universidade de Tartu, passando também tempo em Berlim e na Baviera, onde preparei o meu doutoramento, tendo estudado as liturgias ortodoxas. Tendo feito a minha formação pastoral, ensinei em seguida no Instituto de Teologia em Tallinn, que inclui uma cátedra de teologia ortodoxa, um raro exemplo de cooperação ecuménica de alto nível numa instituição académica eclesiástica. Em virtude do meu interesse pelo mundo ortodoxo, tornei-me membro da primeira comissão de diálogo luterano-ortodoxo na Estónia e fiz parte da Comissão Conjunta Global Luterano-ortodoxa. Depois trabalhei durante cinco anos como secretária para as relações ecuménicas na sede da Federação Luterana Mundial, em Genebra, supervisionando o diálogo com os anglicanos e os menonitas, bem como, em seguida, com os cristãos ortodoxos e pentecostais. Durante esse período ajudei também a coordenar os preparativos do V Centenário da Reforma, que assistiu à oração do Papa Francisco lado a lado com os líderes luteranos, na cidade sueca de Lund, onde foi criada em 1947 a Federação Luterana Mundial. Penso que, sendo embora a Federação Luterana Mundial uma comunhão confessional de Igrejas, sempre esteve muito empenhada na unidade dos cristãos, e a sua constituição foi fortemente influenciada pelo movimento ecuménico mais amplo do início do século XX. Cada comunhão cristã contribui com os seus dons especiais para a Igreja global, pelo que a nossa tradição luterana também dá o seu contributo, sublinhando a centralidade da graça incondicional de Deus e a liberdade que dela deriva.
Outra característica dos reformados foi a importância atribuída à educação para partilhar o Evangelho e encorajar o pensamento crítico. Estes princípios também são centrais na minha compreensão pessoal da missão da Igreja no mundo contemporâneo. Uma das principais inovações, durante o período em que fui diretora para o desenvolvimento no Instituto de Teologia de Tallinn, foi a criação de um mestrado em estudos de cultura cristã. O curso foi concebido como missão académica para quantos trabalhavam no mundo secular, mas queriam compreender algo mais a respeito da própria história e da tradição cristã.

Pensamento crítico para combater a polarização


O programa foi muito bem-sucedido, tendo por base a herança do Instituto de Teologia que permaneceu aberto durante todo o período soviético. Nesses anos, o Instituto forneceu uma formação académica que garantiu aos pastores preparação para pensarem de forma diferente e não apenas a preto e branco. Hoje em dia, atendendo a que muitas sociedades enfrentam uma polarização crescente, é essencial que a Igreja não defenda um paradigma a preto e branco, mas que reflita uma forma de pensar mais diferenciada. Um dos meus objetivos passa por reforçar a rede de educação teológica e de formação da Federação Luterana Mundial, colocando amplamente à disposição materiais para os estudantes que não têm acesso a recursos e formação em pensamento crítico. Ao fazê-lo, espero partilhar alguma da minha experiência de investigação e formação em diferentes campos, incluindo a resolução de conflitos, a assistência psicológica em matéria de VIH e o desenvolvimento das comunidades nas zonas rurais.
Outro objetivo que tenho passa por alargar o debate teológico sobre a compreensão luterana da ordenação, para apoiar as Igrejas que estão a caminhar para a admissão de mulheres ao ministério ordenado e a lugares de liderança. Como primeira mulher a liderar a Federação Luterana Mundial, penso que há mulheres em muitas regiões e em muitas das nossas Igrejas que se sentem encorajadas pelo meu exemplo. Na Estónia, as primeiras mulheres foram ordenadas pastoras há mais de meio século, mas creio que a minha nomeação marca um momento histórico para a nossa Igreja e para a nossa região. Ao mesmo tempo, porém, aguardo com impaciência o dia em que o género deixará de ser um tema no debate sobre lugares de liderança nas nossas Igrejas ou na sociedade.

Teologia, missão e justiça


Entre as principais tarefas que terei de enfrentar, enquanto nova Secretária-Geral, conta-se a supervisão dos preparativos da próxima Assembleia da Federação Luterana Mundial, prevista para Cracóvia em setembro de 2023, com o tema «Um só corpo, um só espírito, uma só esperança». A par do trabalho teológico e ecuménico, é necessário definir orientações para o ramo assistencial e de desenvolvimento da Igreja, conhecido como LWF World Service. Operando em 27 países, frequentemente em locais remotos e de difícil acesso, o nosso World Service é conhecido pelo seu trabalho humanitário profissional, que proporciona uma ligação entre as comunidades locais e a tutela internacional da justiça, da paz e da dignidade humana, especialmente para os mais vulneráveis. Durante muitos anos fomos um dos principais parceiros confessionais no âmbito operacional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e trabalhámos em estreita colaboração com vários parceiros ecuménicos, incluindo a Caritas Internationalis, bem como com outros grupos confessionais, como a Islamic World Relief. A situação dos refugiados, que já preocupava os fundadores da Federação Luterana Mundial no seguimento da II Guerra Mundial, continua a ser ainda hoje uma das nossas principais preocupações no trabalho com as comunidades vulneráveis. Existem atualmente mais de 80 milhões de pessoas no mundo deslocadas internamente ou forçadas a fugir do seu país devido a conflitos, pobreza, perseguição ou à crise climática. Ao mesmo tempo, assistimos à ascensão de regimes autoritários, a uma lentidão das ações empreendidas pelos Estados para reduzir o impacto das alterações climáticas e a uma relutância em respeitar os direitos humanos, particularmente os direitos das mulheres. Outra preocupação é a desigualdade persistente no acesso à vacina contra a COVID em todo o mundo, assim como o facto de as próprias vacinas estarem cada vez mais a ser transformadas numa arma numa guerra de desinformação, somando-se à polarização existente e às teorias da conspiração. Como Federação Luterana Mundial, continuamos a lutar por soluções justas e de longo prazo que sejam coerentes com os objetivos de desenvolvimento sustentável, que enfrentem as causas subjacentes à pobreza, para que todos possam usufruir dos seus direitos e viver uma vida digna.
Tendo crescido numa época em que os direitos e a dignidade eram sistematicamente espezinhados pelo regime soviético, acredito que as nossas Igrejas podem e devem desempenhar um papel essencial na defesa destes valores cristãos na praça pública. Num mundo cada vez mais fragmentado, somos chamados a discernir a vontade de Deus em situações complexas e a ser agentes de mudança positiva e de reconciliação. Como cristãos, temos de passar antes de mais das palavras aos atos, respondendo à vontade de Cristo de unidade e cura no nosso mundo fraturado.

Anne Burghardt
Donne Chiesa Mondo (Janeiro de 2022) 8-10.

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos - 20 de janeiro de 2022

DIA 3

«A esta notícia, o rei Herodes ficou perturbado,
e com ele toda a cidade de Jerusalém» (Mt 2,3)
A presença de Cristo perturba o mundo

Leituras
Ne 4, 10-17 Executávamos a obra...desde o surgir da aurora até o aparecimento das estrelas.
Sl 2,1-10 Por que esta agitação dos povos?
2 Ts 2,13- 3,5 O Senhor é fiel: ele confirma-vos-rá.
Mt 2, 1-5 O rei Herodes ficou perturbado, e com ele toda a cidade de Jerusalém.

Reflexão
O Senhor veio para o meio de nós. A chegada de Cristo perturba os caminhos do mundo. Em contraste com tantos líderes nacionais, o Senhor vem com humildade, denunciando o mal da injustiça e da opressão que acompanha a ambição por poder e prestígio. A vinda de Jesus pede uma mudança de coração e uma transformação de vida, para que as pessoas sejam libertadas de tudo o que as desumaniza e as faz sofrer. Jesus mostra-nos que Deus está com aqueles que sofrem, porque cada ser humano tem uma dignidade de filho amado de Deus. Assim, a presença de Jesus cria distúrbios precisamente porque ele desestabiliza o barco dos ricos e poderosos que trabalham somente pelos seus próprios interesses e negligenciam o bem comum. Mas, para os que trabalham pela paz e a unidade, a vinda de Cristo traz a luz da esperança. Hoje, somos convidados a comprometermo-nos com a ação construtiva de fazer da justiça uma realidade no nosso mundo. Isso inclui a necessidade de refletir e reconhecer as situações em que os nossos caminhos não são os caminhos da justiça e da paz de Deus. Quando os cristãos trabalham juntos pela justiça e pela paz, os nossos esforços são mais poderosos. E quando os cristãos trabalham juntos nesse caminho, a resposta às nossas preces pela unidade cristã torna-se tão visível que outros reconhecem em nós a presença de Cristo no mundo de hoje. Com os nossos trabalhos e ações podemos trazer a luz da esperança a tantos que ainda estão a viver na escuridão da exploração política, da pobreza social e da discriminação estrutural. A Boa Nova é que Deus é fiel, e ele é sempre aquele que nos fortalece, nos protege do mal e nos inspira a trabalhar pelo bem dos outros, especialmente daqueles que estão a viver na escuridão do sofrimento, do ódio, da violência e da dor.

Oração
Senhor, tu nos guiaste para fora da escuridão e nos levaste até Jesus. Iluminaste a estrela da esperança nas nossas vidas. Ajuda-nos a estarmos unidos no nosso compromisso de trazer aqui o teu Reino de justiça e de paz e assim sermos a luz de esperança para todos os que estão a viver na escuridão do desespero e da desilusão. Pega na nossa mão, Senhor, para que possamos ver-te na nossa vida diária. Ao te seguirmos, dissipa o nosso medo e a nossa ansiedade. Faz brilhar sobre nós a tua luz e coloca o teu fogo nos nossos corações para que o teu amor nos aqueça. Levanta-nos em direção a ti, já que te despojaste por nossa causa, para que as nossas vidas te possam glorificar, tu que és Pai, Filho e Espírito Santo. Amém.

19/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos - 19 de janeiro de 2022

DIA 2

«Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer?» (Mt 2,2)
Uma liderança humilde derruba muros e constrói com amor

Leituras 
Jr 23, 1-6 Virá um rei que reina com competência, defende o direito e a justiça.
Sl 46 Ele acaba com os combates até os confins da terra.
Fl 2, 5-11 Ele, que é de condição divina, não se valeu da sua igualdade com Deus.
Mt 20,20-28 O Filho do Homem veio, não para ser servido, mas para servir.

Reflexão
Jeremias denuncia a má liderança dos reis de Israel que dividiram e dispersaram o povo. A liderança deles era do tipo que destruía as nações e levava os cidadãos para o exílio. Opondo-se a tal, o Senhor promete um rei-pastor que vai promover a justiça e o direito na terra e vai unir os membros do seu rebanho. O nosso mundo anseia por boa liderança e está constantemente à procura de alguém que atenda esse desejo. Onde pode alguém achar um líder assim? Somente em Cristo vimos o exemplo de um rei ou líder que corresponde ao coração de Deus. Ao sermos chamados a segui-lo, somos também chamados a imitar o seu modo de ser rei servidor no mundo e na Igreja. Em Cristo encontramos alguém que não derruba nem divide, mas constrói e nos completa para a glória do nome de Deus. A sua regra de vida não é ser servido, e ele não usa força. Em vez disso, nele encontramos um servo humilde e amoroso que não se vale do facto de ser igual a Deus como algo a ser explorado. Ele vem para servir, em vez de ser servido, e os seus seguidores são chamados a fazer o mesmo. Hoje, o Médio Oriente está a viver a experiência da perda dos seus povos que partem para o exílio, já que o direito e a justiça estão a ser formas raras de atendimento, não somente lá, mas também pelo mundo fora. Ainda assim, temos uma esperança que não será abalada mesmo se as nações se encontram em protesto e os reinados a desabar ao nosso redor. As lideranças, tanto no mundo como na Igreja, têm a responsabilidade de unir em vez de dispersar ou dividir o povo de Deus. Muita divisão no mundo e na Igreja é causada pelo desejo de uma posição mais elevada, com mais poder e vantagens pessoais. Quanto mais fielmente os cristãos imitarem a liderança de serviço de Cristo mais a divisão, tanto no mundo como na Igreja, será superada. Ao trabalharmos pelo direito, a justiça e a paz para o bem-estar de todos, testemunhamos humildemente o que nos deixou o rei-pastor e conduzimos outros à sua presença.

Oração
Deus, nosso único refúgio e nossa força, nós te glorificamos porque és um Deus justo e defensor do direito. Confessamos diante de ti que frequentemente cobiçamos modelos mundanos de liderança. Ajuda-nos a buscar nosso Senhor Jesus Cristo não nos palácios dos poderosos, mas na manjedoura humilde, e a imitá-lo na sua simplicidade. Encoraja-nos a nos esvaziarmos de nós mesmos à medida que te obedecemos no serviço recíproco. Assim oramos em nome Cristo, que contigo e com o Espírito Santo reina para sempre na glória. Amém.

18/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos - 18 de janeiro de 2022

DIA 1

«Vimos a sua estrela no oriente» (Mt 2,20)
Levanta-nos e leva-nos a tua perfeita luz

Leituras
Zc 4, 1-7 Tenho uma visão: é um candelabro todo de ouro.
Sl 139,1-10  A tua mão me conduz, a tua destra me segura.
2 Tm 1, 7-10 Esta graça...agora foi manifestada pela aparição de nosso Salvador, Cristo Jesus
Jo 16, 7-14 Quando vier o Espírito da verdade, ele vos conduzirá à verdade plena.

Reflexão
Neste mundo frágil e incerto, buscamos uma luz, um raio de esperança que vem de longe. No meio do mal, ansiamos pela bondade. Buscamos o bem dentro de nós mesmos, mas frequentemente somos dominados por nossa fraqueza e essa esperança acaba por falhar. A nossa confiança repousa no Deus que adoramos. Deus, na sua sabedoria, capacita-nos a ter esperança na sua intervenção divina; mas não percebemos com antecedência que a intervenção de Deus seria uma pessoa, e que o próprio Senhor seria a luz no meio de nós. Isso excedeu todas as nossas expectativas. O dom de Deus para nós é um «espírito de poder e amor». Não é confiando na nossa própria força e habilidade que somos levados adiante no caminho dessa luz perfeita, mas sim por obra do Espírito Santo de Deus. No meio da escuridão da humanidade brilhou a estrela que veio do oriente. Nele vemos uma luz que penetra as profundezas da escuridão que nos separa uns dos outros. A luz da estrela não foi somente uma iluminação num momento histórico particular, mas ela continua a brilhar e a mudar a face da história. Ao longo dos tempos, e mesmo desde que a estrela apareceu pela primeira vez, o mundo começou a conhecer, através da vida dos seguidores de Cristo, a esperança que vem até nós por inspiração do Espírito Santo. Eles deram testemunho da obra de Deus na história e da presença permanente do Espírito Santo. Apesar das transformações da história e da mudança de circunstâncias, o Ressuscitado continua a brilhar, acompanhando o rumo da história como um farol, guiando todos a essa luz perfeita e superando a escuridão que nos separa uns dos outros. O desejo de superar a escuridão que nos separa move-nos a orar e a trabalhar pela unidade cristã.

Oração
Senhor Deus, ilumina o nosso caminho com a luz de Cristo que vai à nossa frente e nos conduz. Esclarece-nos e vem morar em nós. Guia-nos para descobrirmos uma pequena manjedoura nos nossos corações, onde ainda dorme uma grande luz. Criador da luz, nós te agradecemos pelo dom desta estrela que nunca se apaga, Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador. Que ele seja um farol a guiar a nossa peregrinação. Cura as nossas divisões e leva-nos para mais perto da Luz para podermos encontrar nele a nossa unidade. Amém.

13/01/2022

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos (18 a 25 de janeiro de 2022)

«Vimos sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo»
(Mt 2,2)

De acordo com o Evangelho de Mateus (2,1-12), o aparecimento da estrela no céu da Judeia representa um sinal de esperança aguardado há muito tempo, que conduz os magos, e de facto todos os povos da terra, ao lugar onde o verdadeiro rei e Salvador é revelado. Essa estrela é um dom, uma indicação da presença amorosa de Deus para toda humanidade. Para os magos era um sinal de que um rei havia nascido. Com seus raios de luz ela conduz a humanidade na direção de uma luz ainda maior, Jesus, a nova luz que ilumina cada pessoa e nos conduz para a glória do Pai e para o esplendor que ela irradia. Jesus é a luz que veio até as nossas trevas quando, por obra do Espírito Santo, encarnou na Virgem Maria e se tornou humano. Jesus é a luz que foi ainda mais adiante nas trevas do mundo quando, por nós e pela nossa salvação, se despojou e se tornou obediente até a morte. Ele fez isso para iluminar o nosso caminho para o Pai, para que pudéssemos conhecer o Pai e o amor que ele tem por nós, quando nos deu seu único Filho, para que acreditando nele pudéssemos não perecer mas ter a vida eterna.
Os magos viram a estrela e seguiram-na. Tradicionalmente os comentadores têm visto nas figuras dos magos um símbolo da diversidade de povos conhecidos naquele tempo, e um sinal da universalidade do chamamento divino que aparece na luz do astro que brilha vindo do oriente. Eles também veem na ansiosa busca dos magos por um rei recém-nascido toda a busca ansiosa da humanidade pela verdade, a bondade e a beleza. A humanidade vem buscando Deus desde o começo da criação para o venerar. A estrela apareceu quando o Menino Deus nasceu ao completar-se o tempo. Ela anunciou o ato de salvação de Deus, esperado há tanto tempo, que começa no mistério da encarnação.
Os magos revelam-nos a unidade de todas as nações, desejada por Deus. Eles viajam vindos de países distantes e representam culturas diversas, mas são impulsionados pela mesma fome de ver e conhecer o rei recém-nascido, e reúnem-se na pequena casa de Belém para o ato simples de adorar e oferecer presentes. Os cristãos são chamados a ser para o mundo um sinal de Deus, trazendo para cá essa unidade que Ele deseja. Vindos de diferentes culturas, raças e línguas, os cristãos partilham em comum a busca por Cristo e o desejo de o adorar. A missão do povo cristão, portanto, é ser um sinal como foi aquela estrela, para guiar a humanidade na sua busca de Deus, para conduzir todos a Cristo e para ser instrumento através do qual Deus vai trazendo para o meio de nós a unidade de todos os povos.
Parte do ato de adoração dos magos consistiu em abrir os seus tesouros, oferecer os seus presentes, que, desde a antiguidade cristã, têm sido compreendidos como sinais de diferentes aspetos da identidade de Cristo: ouro como sinal de realeza; incenso para a sua divindade e mirra como previsão da sua morte. Os diversos presentes, portanto, oferecem-nos uma imagem de visões particulares que as diferentes tradições cristãs têm a respeito da pessoa e do trabalho de Jesus. Quando cristãos se reúnem e abrem os seus tesouros e os seus corações em adoração a Cristo, todos se enriquecem à medida que essas perceções são partilhadas.
A estrela ergueu-se no oriente (Mt 2,2). É do oriente que o sol se levanta, e é do que chamamos Médio Oriente que a salvação apareceu pela misericórdia do nosso Deus que nos abençoou com o que veio do alto (Lc 1,78). Mas a história do Médio Oriente foi, e ainda é, caracterizada por conflito e violência, manchada com sangue, injustiça e opressão. Mais recentemente, desde a Nakba Palestina (o êxodo da população árabe da Palestina durante a guerra de 1948) a região tem presenciado uma série de guerras e revoluções sangrentas e o crescimento de extremismo religioso. A história dos magos também apresenta vários elementos lamentáveis, particularmente as ordens despóticas de Herodes para o massacre de todos os meninos ao redor de Belém que tivessem menos de dois anos (Mt 2, 16-18). A crueldade dessas narrativas ressoa junto com a longa história e a difícil realidade presente do Médio Oriente.
Foi no Médio Oriente que a Palavra de Deus criou raízes e deu frutos. E foi a partir desse Oriente que os apóstolos saíram para pregar o Evangelho até os confins da terra (At 1,8). O Médio Oriente produziu milhares de testemunhas cristãs e milhares de mártires cristãos. E ainda assim, agora, a própria existência da pequena comunidade cristã é ameaçada já que muitos são levados a buscar uma vida mais segura e serena em outro lugar. Como aconteceu com a luz que era o Menino Jesus, a luz do cristianismo do Oriente Médio é crescentemente ameaçada nestes tempos difíceis.
Jerusalém é um símbolo poderoso para os cristãos porque é a cidade de paz onde toda a humanidade foi salva e redimida. Mas hoje falta paz na cidade. Muitos partidos declaram o seu direito em relação a ela e desconsideram outros. Até a oração em Jerusalém passou a estar sujeita a medidas políticas e militares. Jerusalém foi a cidade de reis, de facto a cidade na qual Jesus entrará triunfante, aclamado como rei (Lc 19,28-44). Naturalmente os magos esperavam encontrar o rei recém-nascido revelado pela estrela naquela cidade real. No entanto, a narrativa diz-nos que, em vez de ser abençoada pelo nascimento do rei Salvador, toda a Jerusalém estava em tumulto, tanto como acontece hoje.
Hoje, mais do que nunca, o Médio Oriente precisa de uma luz celeste para acompanhar o seu povo. A estrela de Belém é um sinal de que Deus caminha com o seu povo, sente as suas dores, escuta os seus gritos e demonstra-lhes compaixão. Isso garante-nos que, mesmo que as circunstâncias mudem e os desastres terríveis possam acontecer, a fidelidade de Deus é infalível. O Senhor não dorme nem descansa. Ele caminha ao lado do seu povo e trá-lo de volta quando se vê perdido ou em perigo. A jornada da fé é essa caminhada com Deus, que sempre contempla seu povo e nos guia nos caminhos complexos da história e da vida. Para esta Semana de Oração, os cristãos do Oriente Médio escolheram o tema da estrela que se ergueu do oriente por um número de razões. Enquanto muitos cristãos ocidentais celebram o Natal, a festa mais antiga e ainda a festa principal de muitos cristãos orientais é a Epifania, quando a salvação é revelada às nações em Belém e no Jordão. Esse foco na teofania (a manifestação) é, em certo sentido, um tesouro que os cristãos do Médio Oriente podem oferecer aos seus irmãos e irmãs do mundo inteiro.
A estrela conduz os magos através do tumulto de Jerusalém, onde Herodes planeia o assassinato da vida inocente. Ainda hoje e, em muitas partes do mundo, inocentes sofrem violência e ameaças. Famílias de jovens fogem de tiranos como Herodes e Augusto. Nesse contexto, pessoas procuram um sinal de que Deus está com elas. Procuram o rei recém-nascido, o rei da delicadeza, da paz e do amor. Mas onde está a estrela que conduz a um caminho que leva a ele? É a missão da Igreja ser a estrela que ilumina o caminho para Cristo, que é a luz do mundo. Sendo uma estrela assim, a Igreja torna-se um sinal de esperança num mundo cheio de problemas e também sinal, no meio do seu povo, da presença de Deus, que acompanha a todos nas dificuldades da vida. Com a palavra e com a ação os cristãos são chamados a iluminar o caminho para que Cristo possa ser revelado, de novo, às nações. Mas as divisões entre nós diminuem a luz do testemunho cristão e obscurecem o caminho, evitando que outros encontrem a direção que leva a Cristo. Ao contrário, os cristãos unidos na sua adoração a Cristo e capazes de abrir seus tesouros numa partilha de dons tornam-se um sinal da unidade que Deus deseja para toda a sua criação.
Os cristãos do Médio Oriente oferecem estes recursos para a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos conscientes de que o mundo partilha muitos dos problemas e dificuldades que eles experimentam, e anseiam por uma luz que aponte o caminho para o Salvador que pode vencer as trevas. A pandemia global da COVID-19, a permanente crise económica e o fracasso das estruturas políticas, económicas e sociais na proteção dos mais fracos e vulneráveis destacaram a necessidade global de uma luz que brilhe na escuridão. A estrela que brilhou no oriente, o Médio Oriente, há dois mil anos, ainda nos chama à manjedoura, onde Cristo nasceu. Ela conduz-nos para onde o Espírito de Deus está vivo e ativo, para a realidade do nosso batismo e para a transformação dos nossos corações.
Após encontrarem o Salvador e o adorarem juntos, os magos regressam aos seus países por um caminho diferente, tendo sido alertados num sonho. De modo semelhante, a comunhão que vivenciamos na nossa oração em conjunto deve inspirar-nos a voltar às nossas vidas, às nossas igrejas e ao nosso mundo de novas maneiras. Viajar por novos caminhos é um convite ao arrependimento e à renovação das nossas vidas pessoais, nas nossas igrejas e nas nossas sociedades. O seguimento de Cristo é o nosso novo caminho e, num mundo em mudança, os cristãos precisam de permanecer firmes e determinados como as constelações e planetas que brilham. Mas o que é que isso significa na prática? Servir o Evangelho hoje é algo que requer um compromisso na defesa da dignidade humana, especialmente no meio dos mais pobres, mais fracos e marginalizados. Isso exige das Igrejas transparência e reconhecimento responsável ao lidar com o mundo e uns com os outros. Isso significa que as Igrejas precisam de colaborar para providenciar alívio aos aflitos, para acolher os deslocados, para aliviar os sobrecarregados e para construir uma sociedade justa e honesta. Esse é um chamamento às Igrejas para o trabalho em conjunto para que os jovens possam construir um futuro de acordo com o coração de Deus, um futuro em que todos os seres humanos possam experimentar vida, paz, justiça e amor. O novo caminho entre as Igrejas é o caminho da unidade visível que, orando e celebrando, buscamos com coragem e audácia para que, dia após dia, «Deus seja tudo em todos» (1 Cor 15,28).

Subsídios para a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos e para todo o ano 2022